O quarto da directora do gabinete de imprensa Birdsong é a sua casa mais interior.
A madeira acompanha-nos sempre, assim como a atmosfera acolhedora. Há uma doce mistura no ar, ora a canela, ora a chá verde. Talvez seja do cruzamento de raízes que encontramos na vida de Manuela. É filha de mãe alemã e pai indiano, nasceu em Genéve, Suíça, e viveu parte da infância em França, antes de vir para Portugal, aos cinco anos. Diz sentir-se portuguesa, mas prefere ver-se como cidadã do mundo. A moda é o seu universo, mas são os tecidos que mais a fascinam. Antes de lançar a agência de comunicação BirdSong, da qual é proprietária, foi criadora de bijutaria (tendo feito a sua primeira colecção para o designer Filipe Faísca) e stylist, nas revistas Marie Claire e Elle. É metódica e espiritual, de cultura cristã mas com uma forte atracção pelo hinduísmo. E o seu quarto é um reflexo dessa interessante dualidade. Ora vejam.
Que quarto lindo! Sabes que sempre imaginei o quarto ideal, mas os meus quartos são sempre uma espécie de acampamento, algo provisório.
Então quer dizer que não tens o quarto dos teus sonhos... Nem por isso, mas sinto-me bem em ter um quarto assim, improvisado. Às vezes, quando vejo revistas, imagino-me a ter um quarto todo pensado, com closet, etc. Mas na realidade, a minha tendência é para que seja um espaço mais espontâneo.
Há quanto tempo vives nesta casa? Fez oito anos em Junho.
Adoro a inspiração étnica, as cores e os deuses das almofadas. Quem são? Um é o Ganesh e o outro a deusa Lakshmi. Ambos têm um significado importante para mim. São dois deuses hindus com um simbolismo especial: o Ganesh representa a superação dos obstáculos e a Lakshmi, a riqueza, tanto material como interior. Mas estão naquelas almofadas por acaso. Comprei os panos, recortei-os e cosi-os por cima das almofadas. Gosto muito de cor e adoro misturar tecidos e padrões.
Pois, lembro-me de me contares que fazes colecção de tecidos... sim, colecciono tecidos e tenho pena de ter tudo guardado. Por mim usava tecidos diferentes em todos os cantos da casa: cortinas, almofadas, toalhas de mesa, para forrar estofos... Se pudesse, até usava muito mais roupa colorida do que o que uso. Por causa do trabalho, acaba por não ser tão prático. Mas adoro...
E já que falamos de cor, achas que existe algum tom que nunca porias no teu quarto? Acho que cada pessoa tem de encontrar uma certa harmonia nas cores. Eu para me sentir bem, tenho de ter cores quentes. Depois no Verão, coloco uma coberta branca, que dá uma sensação de frescura. Mas prefiro sentir tons quentes à minha volta, porque são mais acolhedoras, não é?
Sim, concordo. Já percebi que tens uma ligação muito grande ao têxtil, que depois se estende tanto para a Moda como para o design. Os tecidos são a base. A minha atracção por moda começou muito pelo fascínio dos tecidos. Não só os padrões, mas também as texturas dos tecidos, e na moda eles são o ponto de começo. Tenho essa ligação especial e, portanto, é normal que na minha casa isso esteja reflectido. Secalhar no meu quarto, que é a zona mais íntima, estou à vontade para ser o mais exuberante possível.
Passas muito tempo no quarto? Passo mais no Inverno. Por exemplo, se trago trabalho para casa, à noite sento-me em cima da cama com o computador nos joelhos, e fico a trabalhar. Por uma questão de aconchego... estou mais quente.
É a zona que te dá mais conforto...sim e onde me sinto mesmo bem. Faço com que o meu quarto seja confortável e que seja o meu espaço, para quando quero estar sozinha ou quando quero ler um livro. Prefiro fazê-lo na cama, em vez de na sala. É um pouco o meu refúgio do resto da confusão da casa.
Tens algum objecto no quarto que te seja mais especial? Tenho as fotografias dos meus filhos, os desenhos deles...
O que é que nunca pode faltar no teu quarto? Alguma coisa para ler, a possibilidade de ter várias intensidades de luz e calor, no Inverno. Tem de estar quentinho!
Também sei que adoras velas. Tens algum aroma de eleição para a casa? Gosto muito de cheiros com base de canela e outras especiarias. Às vezes também queimo incenso, mas prefiro velas.
E fazes mudanças frequentes na disposição dos móveis? Sim, costumo fazer. Por acaso mudei a disposição do quarto há pouco tempo. A cama não estava aqui. Mudo o sítio dos móveis, das almofadas...
Porque é que sentes necessidade de mudar? Para refrescar a casa, para sentir que, de repente, estou no mesmo sítio mas com contornos diferentes; numa casa mais refrescada. E preciso também de deitar fora coisas que se acumulam. Sabe-me tão bem!
És muito ligada aos objectos? As coisas que têm um significado, porque foi alguém que me ofereceu ou porque foi uma compra especial, guardo-as. Há outras que vou guardando sem saber muito bem porquê. A roupa, por exemplo. Dizemos sempre “vou guardar porque acho que ainda vou usar”, e depois tudo se acumula. Chega a uma altura que é preciso deitar fora. E é uma sensação de alívio despegar-nos dessas coisas, tanto pelo espaço como pelo facto de termos conseguido ultrapassar a ligação física que tínhamos. A arrumação da casa tem muito essa dualidade: o lado prático e a vertente de limpeza quase pessoal e interior.
E se pudesses conhecer a casa de alguém, de quem escolherias? Hum...não tenho a tendência de cultivar ídolos, há muitas pessoas que admiro, mas não tenho propriamente a curiosidade de entrar na sua intimidade. Mas achava engraçado entrar na casa da Rainha de Inglaterra, na sua zona mais privada, no quarto e na sala. É algo que me ocorre, assim de repente. Gosto de ver aquelas casas lindas nas revistas de decoração, mas não sinto curiosidade de conhecer a casa de alguém em particular.
Eu fico sempre a imaginar como serão as casas dos artistas, cheias de obras de arte por todo lado... Sim, mas eu sei que todas essas casas são lindíssimas. Só que acho mais curioso, por exemplo, conhecer casas-museus de artistas ou casas de infância...gosto de saber como se viveu noutras épocas e noutras culturas, mais do que conhecer casas contemporâneas, de pessoas que vivem no nosso tempo.
Tens algum estilo de design com o qual te identifiques mais? Admiro muito casas modernas, linhas minimais, arquitectos que foram inovadores nos anos 60, as casas da Bauhaus. Gosto muito de todo esse movimento modernista que apareceu no início do século XX, do estilo de Mies van der Rohe, por exemplo. Só que, na prática, para viver, julgo que prefiro uma casa de madeira, mais orgânica, mais caótica. Uma casa muito posta por ordem não tinha muito a ver comigo.
Pois, compreendo-te. Por exemplo, adorei a casa que aparece no filme do Tom Ford, A Single Man.É absolutamente magnífica. Queria aquela casa, sem pestanejar! Agora, o estilo moderno que envolve betão, cinzento, tudo muito branco e clean...não faz o meu género.
E como era o teu quarto de infância, recordas-te bem? Sim! Tinha muitos objectos nas paredes, tinha as minhas bonecas sempre expostas. As cortinas eram cor-de-rosa, que eu pedi especialmente à minha mãe (e ela teve o bom senso de as mandar fazer rosa velho!); tinha uma colcha às flores, que na altura quis que fosse Laura Ashley, porque achava aquelas flores britânicas. Sempre quis que o meu quarto fosse muito feminino, com padrões e cores.
© photography Sara Gomes
© text Carolina Almeida
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